sábado, 29 de julho de 2017

Análise: Poética - Manuel Bandeira



Estou farto do lirismo comedido
Do lirismo bem comportado
Do lirismo funcionário público com livro de ponto expediente
Protocolo e manifestações de apreço ao Sr. Diretor.
Estou farto do lirismo que pára e vai averiguar no dicionário o cunho vernáculo de um vocábulo.
Abaixo os puristas

Todas as palavras sobretudo os barbarismos universais
Todas as construções sobretudo as sintaxes de excepção
Todos os ritmos sobretudo os inumeráveis

Estou farto do lirismo namorador
Político
Raquítico
Sifilítico
De todo lirismo que capitula ao que quer que seja fora de si mesmo
De resto não é lirismo
Será contabilidade tabela de co-senos secretário
Do amante exemplar com cem modelos de cartas
E as diferentes maneiras de agradar às mulheres, etc.

Quero antes o lirismo dos loucos
O lirismo dos bêbados
O lirismo difícil e pungente dos bêbedos
O lirismo dos clowns de Shakespeare
– Não quero mais saber do lirismo que não é libertação

Análise
De Caráter modernista, utiliza versos livres, de repetição, supressão de regras de pontuação e alguns retratam imagens negativas sobre os valores dos movimentos anteriores, estas formas traduzem a liberdade do movimento modernista. O verso livre não utiliza as regras tradicionais tanto na métrica e na versificação, o qual baseia seu efeito poético principalmente no ritmo. O que caracteriza o versolivrismo aqui é uma mudança de atitude e também de crítica: a sílaba deixa de ser a unidade de medida e a combinação de pausas e entoações passa a ser fator relevante.
Manuel Bandeira emprega várias imagens para iniciar o processo de negação dos valores poéticos do passado e depois de defesa de um lirismo libertador; imagens que são modeladas em linguagem cotidiana e que estão baseadas na associação destas ideias de modo a despertar o interesse por uma atualização da inteligência artística. O poema Poética de Manuel Bandeira é um dos paradigmas da estética modernista e uma das mais conhecidas bandeiras de luta dos modernistas por esta atualização poética. Podemos dividir o poema em duas macro partes: repulsa dos elementos normativos e da ordem que transformam a arte em ato burocrático e pregação de um lirismo espontâneo, sem censuras e repressões.

Na introdução do poema deixa claro o caráter contestatório através do uso de reiterações que marcam um descontentamento com o tipo de lírica utilizada dado pela fastidiosa repetição do “estou farto”.

Estou farto do lirismo comedido ...
Estou farto do lirismo que pára ...
Estou farto do lirismo namorador...


A utilização do pronome “todo” reforça a ideia de negação a tudo que não seja o lirismo que não é libertação. Novamente, o poeta distancia-se dos valores tradicionais e nega por completo as manifestações líricas que limitam a liberdade poética com expressões como “abaixo os puristas”, “de resto não é lirismo”, “não quero mais”.

Para expressar mais ainda sua insatisfação, o poeta incorpora elementos estereotipados das estéticas anteriores para ironiza-las, utilizando expressões científicas e imagens típicas do cotidiano moderno. As referências aos “lirismo comedido e bem comportado”.

Convém salientar que a atitude de Bandeira utilizada em todo o poema para ironizar os valores estéticos, que destroem a originalidade, é recorrer a estereótipos que limitam a criação poética, que se caracterizam por racionais, burocráticos, bajulatórios e formais. “Estou farto (....) do lirismo funcionário público com livro de ponto expediente protocolo e manifestações de apreço ao sr. Diretor ...”. O poeta utiliza uma personagem tipicamente modernista, protagonista das cidades: a figura do funcionário público que trabalha em um ambiente burocrático e que apresenta em seu cotidiano uma série de formalidades que devem ser cumpridas como livro de ponto, expediente rígido e protocolo. Este tipo de lirismo é cada vez mais parodiado quando Bandeira diz que ainda é um lirismo de “manifestações de apreço ao sr. Diretor”. Esta última expressão carrega uma carga de humor e fornece uma característica bastante comum do desenvolvimento histórico do Brasil clientelista,ccujos cargos públicos são conseguidos e/ou mantidos em troca de favores, votos recebidos e bajulações ao “sr. Diretor”. Este lirismo condenado por Bandeira é justamente aquele cujo indivíduo prefere ter uma posição de subalternidade, de bajulação à ordem vigente e de obediência à máquina burocratizante a ter como centro motivador a si mesmo.

Outra estética que Bandeira ironiza no poema é a romântica: o lirismo namorador, político, raquítico e sifilítico. Ao utilizar as formas adjetivas citadas, o poeta caracteriza os principais aspectos abordados pelos poetas românticos e com a forma verbal reafirma novamente que está farto deste tipo de lirismo também.

- Namorador : amor extremo e idealizado e sentimentalismo. - Político: amor à Pátria e o engajamento político dos poetas - Raquítico e sifilítico: o apego à solidão, ao ambiente noturno, ao “mal do século romântico” que os deixam em um estado doentio, debilitado.

(ENEM) “Poética”, de Manuel Bandeira, é quase um manifesto do movimento modernista brasileiro de 1922. No poema, o autor elabora críticas e propostas que representam o pensamento estético predominante na época.
Com base na leitura do poema, podemos afirmar corretamente que o poeta:
a) Critica o lirismo louco do movimento modernista.
b) Critica todo e qualquer lirismo na literatura.
c) Propõe o retorno ao lirismo do movimento clássico.
d) Propõe o retorno do movimento romântico.
e) Propõe a criação de um novo lirismo.

domingo, 23 de julho de 2017

Análise: Poema Psicologia de um vencido- Augusto dos Anjos



Análise – Poema Psicologia de um vencido- Augusto dos Anjos

Eu, filho do carbono e do amoníaco,
Monstro de escuridão e rutilância,
Sofro, desde a epigênesis da infância,
A influência má dos signos do zodíaco.

Profundíssimamente hipocondríaco,
Este ambiente me causa repugnância…
Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia
Que se escapa da boca de um cardíaco.

Já o verme — este operário das ruínas —
Que o sangue podre das carnificinas
Come, e à vida em geral declara guerra,

Anda a espreitar meus olhos para roê-los,
E há de deixar-me apenas os cabelos,
Na frialdade inorgânica da terra!

Análise

Augusto dos Anjos, escritor paraibano, é muito conhecido pelo seu pessimismo e suas imagens mórbidas e impactantes. Escreveu apenas um livro, “Eu”, que é composto de 58 poemas que abordam a temática da podridão, do terror, da morte e do sofrimento. Posteriormente o esse livro foi republicado e teve mais textos adicionados, mudando assim seu título para “Eu e outras poesias”. Dentre os 58 poemas contidos no livro, está “Psicologia de um vencido” que retrata o decadência do ser humano.

•1ª estrofe:
"Eu, filho do carbono e do amoníaco,
Monstro de escuridão e rutilância,
Sofro, desde a epigênese da infância,
A influência má dos signos do zodíaco."

O personagem retratado no poema é o próprio eu lírico. No primeiro verso, Augusto dos Anjos faz referência ao carbono e ao amoníaco, sendo os dois compostos da atmosfera primitiva que pode ser representada pelo vulcão, que tem em sua composição CO2, NH3 e H20. O carbono também é abundante no corpo humano, o que demonstra a intenção do autor em dizer que é filho da matéria simples.

O eu lírico se apresenta como filho do carbono e da amônia, ou seja, é apenas uma formação de dois elementos orgânicos químicos presentes em vários seres vivos. O carbono que é aproximadamente 20% do corpo humano e a amônia, que é um gás muito conhecido pelo seu mau cheiro. Além disso, o eu lírico expõe que é um monstro que tem uma dor contínua desde sua hepigênesis (teoria da formação dos seres por geração gradual) até níveis cosmológicos.

No segundo verso o autor utiliza a palavra “monstro” no sentido de depreciação a si mesmo, uma característica comum em seus poemas. No terceiro verso há o sofrimento gradual, e no verso seguinte o seu sofrimento toma proporções universais.

•2ª estrofe:
"Profundissimamente hipocondríaco,
Este ambiente me causa repugnância ...
Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia
Que se escapa da boca de um cardíaco."

Nessa estrofe o autor descreve o ambiente em que ele se encontra, sendo esse um lugar de dor e sofrimento que lhe causa ânsia e repugnância. Mais uma vez é usada a fisiologia, uma das marcas registradas de Augusto dos Anjos.

Na segunda estrofe, é apresentada a insatisfação e repugnância do ambiente que o eu lírico está. Resumindo, ele é um monstro, filho da vida (carbono), que vive em um ambiente de total sofrimento que lhe causa repugnância.

•3ª estrofe:
"Já o verme – esse operário das ruínas –
Que o sangue podre das carnificinas
Come, e à vida em geral declara guerra,"
O verme pode ser considerado outro “personagem” do poema já que ele representa um certo tipo de inimigo do eu lírico quando ele “declara guerra à vida”, sendo essa sua ação.

A terceira estrofe inicia com a apresentação do verme – “operário das ruínas” – um ser indefeso e insignificante, quando comparado à um homem vivo, que opera com o fim da vida comendo o sangue podre e declarando guerra ao que resta do carbono. O verme é tão traiçoeiro, que espreita os olhos do eu lírico para roê-los e acabar com a percepção de cores e formas do ambiente que o monstro, filho do carbono, tem repugnância. Contudo, o verme deixa os cabelos, pois os vermes não digerem a queratina (principal componente do cabelo).

•4ª estrofe:
"Anda a espreitar meus olhos para roê-los,
E há de deixar-me apenas os cabelos,
Na frialdade inorgânica da terra."

O verme espreita os olhos (permite a visão do mundo) do eu lírico e deixa apenas o cabelo que é constituído de queratina, que é resistente ao tempo e que não pode ser decomposta pelos vermes.

No fim, o papel do verme foi de total decadência da vida, pois após a decomposição do eu lírico, não resta nada além da “frialdade inorgânica da terra”, ou seja, o que era orgânico e vivo (carbono), agora é inorgânico e morto (terra).

"A frialdade inorgânica" é o 'fim' do eu lírico que inicialmente era filho do carbono (representação da vida) e que agora está em um ambiente inorgânico (oposto da vida). A parte inorgânica da terra pode ser considerada como um solo firmado por desgaste das rochas e minerais inorgânicos.

(PAS-UnB 3ª etapa 2013) Considerando os aspectos linguísticos e as ideias presentes no poema Psicologia de um vencido, de Augusto dos Anjos, julgue os itens que se seguem.
1- Ao empregar no poema um vocabulário de áreas como a química, o eu lírico busca acentuar a dimensão material do ser humano, o qual não passa de uma combinação química, e mostrar que o ser humano é impotente ante a força da morte, caracterizada metaforicamente na figura do verme que declara guerra à vida.
2- Na caracterização do eu lírico (na primeira estrofe) e na caracterização do verme (na terceira estrofe), o poeta valeu-se de paralelismo sintático.


quinta-feira, 20 de julho de 2017

Análise: Amor - Clarice Lispector.

Um pouco cansada, com as compras deformando o novo saco de tricô, Ana subiu no bonde. Depositou o volume no colo e o bonde começou a andar. Recostou-se então no banco procurando conforto, num suspiro de meia satisfação.

Os filhos de Ana eram bons, uma coisa verdadeira e sumarenta. Cresciam, tomavam banho, exigiam para si, malcriados, instantes cada vez mais completos. A cozinha era enfim espaçosa, o fogão enguiçado dava estouros. O calor era forte no apartamento que estavam aos poucos pagando. Mas o vento batendo nas cortinas que ela mesma cortara lembrava-lhe que se quisesse podia parar e enxugar a testa, olhando o calmo horizonte. Como um lavrador. Ela plantara as sementes que tinha na mão, não outras, mas essas apenas. E cresciam árvores. Crescia sua rápida conversa com o cobrador de luz, crescia a água enchendo o tanque, cresciam seus filhos, crescia a mesa com comidas, o marido chegando com os jornais e sorrindo de fome, o canto importuno das empregadas do edifício. Ana dava a tudo, tranquilamente, sua mão pequena e forte, sua corrente de vida.

Certa hora da tarde era mais perigosa. Certa hora da tarde as árvores que plantara riam dela. Quando nada mais precisava de sua força, inquietava-se. No entanto sentia-se mais sólida do que nunca, seu corpo engrossara um pouco e era de se ver o modo como cortava blusas para os meninos, a grande tesoura dando estalidos na fazenda. Todo o seu desejo vagamente artístico encaminhara-se há muito no sentido de tornar os dias realizados e belos; com o tempo, seu gosto pelo decorativo se desenvolvera e suplantara a íntima desordem. Parecia ter descoberto que tudo era passível de aperfeiçoamento, a cada coisa se emprestaria uma aparência harmoniosa; a vida podia ser feita pela mão do homem.

No fundo, Ana sempre tivera necessidade de sentir a raiz firme das coisas. E isso um lar perplexamente lhe dera. Por caminhos tortos, viera a cair num destino de mulher, com a surpresa de nele caber como se o tivesse inventado. O homem com quem casara era um homem verdadeiro, os filhos que tivera eram filhos verdadeiros. Sua juventude anterior parecia-lhe estranha como uma doença de vida. Dela havia aos poucos emergido para descobrir que também sem a felicidade se vivia: abolindo-a, encontrara uma legião de pessoas, antes invisíveis, que viviam como quem trabalha — com persistência, continuidade, alegria. O que sucedera a Ana antes de ter o lar estava para sempre fora de seu alcance: uma exaltação perturbada que tantas vezes se confundira com felicidade insuportável. Criara em troca algo enfim compreensível, uma vida de adulto. Assim ela o quisera e o escolhera.

Sua precaução reduzia-se a tomar cuidado na hora perigosa da tarde, quando a casa estava vazia sem precisar mais dela, o sol alto, cada membro da família distribuído nas suas funções. Olhando os móveis limpos, seu coração se apertava um pouco em espanto. Mas na sua vida não havia lugar para que sentisse ternura pelo seu espanto — ela o abafava com a mesma habilidade que as lides em casa lhe haviam transmitido. Saía então para fazer compras ou levar objetos para consertar, cuidando do lar e da família à revelia deles. Quando voltasse era o fim da tarde e as crianças vindas do colégio exigiam-na. Assim chegaria a noite, com sua tranqüila vibração. De manhã acordaria aureolada pelos calmos deveres. Encontrava os móveis de novo empoeirados e sujos, como se voltassem arrependidos. Quanto a ela mesma, fazia obscuramente parte das raízes negras e suaves do mundo. E alimentava anonimamente a vida. Estava bom assim. Assim ela o quisera e escolhera.

O bonde vacilava nos trilhos, entrava em ruas largas. Logo um vento mais úmido soprava anunciando, mais que o fim da tarde, o fim da hora instável. Ana respirou profundamente e uma grande aceitação deu a seu rosto um ar de mulher.

O bonde se arrastava, em seguida estacava. Até Humaitá tinha tempo de descansar. Foi então que olhou para o homem parado no ponto.

A diferença entre ele e os outros é que ele estava realmente parado. De pé, suas mãos se mantinham avançadas. Era um cego.

O que havia mais que fizesse Ana se aprumar em desconfiança? Alguma coisa intranquila estava sucedendo. Então ela viu: o cego mascava chicles... Um homem cego mascava chicles.

Ana ainda teve tempo de pensar por um segundo que os irmãos viriam jantar — o coração batia-lhe violento, espaçado. Inclinada, olhava o cego profundamente, como se olha o que não nos vê. Ele mascava goma na escuridão. Sem sofrimento, com os olhos abertos. O movimento da mastigação fazia-o parecer sorrir e de repente deixar de sorrir, sorrir e deixar de sorrir — como se ele a tivesse insultado, Ana olhava-o. E quem a visse teria a impressão de uma mulher com ódio. Mas continuava a olhá-lo, cada vez mais inclinada — o bonde deu uma arrancada súbita jogando-a desprevenida para trás, o pesado saco de tricô despencou-se do colo, ruiu no chão — Ana deu um grito, o condutor deu ordem de parada antes de saber do que se tratava — o bonde estacou, os passageiros olharam assustados.

Incapaz de se mover para apanhar suas compras, Ana se aprumava pálida. Uma expressão de rosto, há muito não usada, ressurgia-lhe com dificuldade, ainda incerta, incompreensível. O moleque dos jornais ria entregando-lhe o volume. Mas os ovos se haviam quebrado no embrulho de jornal. Gemas amarelas e viscosas pingavam entre os fios da rede. O cego interrompera a mastigação e avançava as mãos inseguras, tentando inutilmente pegar o que acontecia. O embrulho dos ovos foi jogado fora da rede e, entre os sorrisos dos passageiros e o sinal do condutor, o bonde deu a nova arrancada de partida.

Poucos instantes depois já não a olhavam mais. O bonde se sacudia nos trilhos e o cego mascando goma ficara atrás para sempre. Mas o mal estava feito.

A rede de tricô era áspera entre os dedos, não íntima como quando a tricotara. A rede perdera o sentido e estar num bonde era um fio partido; não sabia o que fazer com as compras no colo. E como uma estranha música, o mundo recomeçava ao redor. O mal estava feito. Por quê? Teria esquecido de que havia cegos? A piedade a sufocava, Ana respirava pesadamente. Mesmo as coisas que existiam antes do acontecimento estavam agora de sobreaviso, tinham um ar mais hostil, perecível... O mundo se tornara de novo um mal-estar. Vários anos ruíam, as gemas amarelas escorriam. Expulsa de seus próprios dias, parecia-lhe que as pessoas da rua eram periclitantes, que se mantinham por um mínimo equilíbrio à tona da escuridão — e por um momento a falta de sentido deixava-as tão livres que elas não sabiam para onde ir. Perceber uma ausência de lei foi tão súbito que Ana se agarrou ao banco da frente, como se pudesse cair do bonde, como se as coisas pudessem ser revertidas com a mesma calma com que não o eram.

O que chamava de crise viera afinal. E sua marca era o prazer intenso com que olhava agora as coisas, sofrendo espantada. O calor se tornara mais abafado, tudo tinha ganho uma força e vozes mais altas. Na Rua Voluntários da Pátria parecia prestes a rebentar uma revolução, as grades dos esgotos estavam secas, o ar empoeirado. Um cego mascando chicles mergulhara o mundo em escura sofreguidão. Em cada pessoa forte havia a ausência de piedade pelo cego e as pessoas assustavam-na com o vigor que possuíam. Junto dela havia uma senhora de azul, com um rosto. Desviou o olhar, depressa. Na calçada, uma mulher deu um empurrão no filho! Dois namorados entrelaçavam os dedos sorrindo... E o cego? Ana caíra numa bondade extremamente dolorosa.

Ela apaziguara tão bem a vida, cuidara tanto para que esta não explodisse. Mantinha tudo em serena compreensão, separava uma pessoa das outras, as roupas eram claramente feitas para serem usadas e podia-se escolher pelo jornal o filme da noite - tudo feito de modo a que um dia se seguisse ao outro. E um cego mascando goma despedaçava tudo isso. E através da piedade aparecia a Ana uma vida cheia de náusea doce, até a boca.

Só então percebeu que há muito passara do seu ponto de descida. Na fraqueza em que estava, tudo a atingia com um susto; desceu do bonde com pernas débeis, olhou em torno de si, segurando a rede suja de ovo. Por um momento não conseguia orientar-se. Parecia ter saltado no meio da noite.

Era uma rua comprida, com muros altos, amarelos. Seu coração batia de medo, ela procurava inutilmente reconhecer os arredores, enquanto a vida que descobrira continuava a pulsar e um vento mais morno e mais misterioso rodeava-lhe o rosto. Ficou parada olhando o muro. Enfim pôde localizar-se. Andando um pouco mais ao longo de uma sebe, atravessou os portões do Jardim Botânico.

Andava pesadamente pela alameda central, entre os coqueiros. Não havia ninguém no Jardim. Depositou os embrulhos na terra, sentou-se no banco de um atalho e ali ficou muito tempo.

A vastidão parecia acalmá-la, o silêncio regulava sua respiração. Ela adormecia dentro de si.

De longe via a aléia onde a tarde era clara e redonda. Mas a penumbra dos ramos cobria o atalho.

Ao seu redor havia ruídos serenos, cheiro de árvores, pequenas surpresas entre os cipós. Todo o Jardim triturado pelos instantes já mais apressados da tarde. De onde vinha o meio sonho pelo qual estava rodeada? Como por um zunido de abelhas e aves. Tudo era estranho, suave demais, grande demais.

Um movimento leve e íntimo a sobressaltou — voltou-se rápida. Nada parecia se ter movido. Mas na aléia central estava imóvel um poderoso gato. Seus pêlos eram macios. Em novo andar silencioso, desapareceu.

Inquieta, olhou em torno. Os ramos se balançavam, as sombras vacilavam no chão. Um pardal ciscava na terra. E de repente, com mal-estar, pareceu-lhe ter caído numa emboscada. Fazia-se no Jardim um trabalho secreto do qual ela começava a se aperceber.

Nas árvores as frutas eram pretas, doces como mel. Havia no chão caroços secos cheios de circunvoluções, como pequenos cérebros apodrecidos. O banco estava manchado de sucos roxos. Com suavidade intensa rumorejavam as águas. No tronco da árvore pregavam-se as luxuosas patas de uma aranha. A crueza do mundo era tranquila. O assassinato era profundo. E a morte não era o que pensávamos.

Ao mesmo tempo que imaginário — era um mundo de se comer com os dentes, um mundo de volumosas dálias e tulipas. Os troncos eram percorridos por parasitas folhudas, o abraço era macio, colado. Como a repulsa que precedesse uma entrega — era fascinante, a mulher tinha nojo, e era fascinante.

As árvores estavam carregadas, o mundo era tão rico que apodrecia. Quando Ana pensou que havia crianças e homens grandes com fome, a náusea subiu-lhe à garganta, como se ela estivesse grávida e abandonada. A moral do Jardim era outra. Agora que o cego a guiara até ele, estremecia nos primeiros passos de um mundo faiscante, sombrio, onde vitórias-régias boiavam monstruosas. As pequenas flores espalhadas na relva não lhe pareciam amarelas ou rosadas, mas cor de mau ouro e escarlates. A decomposição era profunda, perfumada... Mas todas as pesadas coisas, ela via com a cabeça rodeada por um enxame de insetos enviados pela vida mais fina do mundo. A brisa se insinuava entre as flores. Ana mais adivinhava que sentia o seu cheiro adocicado... O Jardim era tão bonito que ela teve medo do Inferno.

Era quase noite agora e tudo parecia cheio, pesado, um esquilo voou na sombra. Sob os pés a terra estava fofa, Ana aspirava-a com delícia. Era fascinante, e ela sentia nojo.

Mas quando se lembrou das crianças, diante das quais se tornara culpada, ergueu-se com uma exclamação de dor. Agarrou o embrulho, avançou pelo atalho obscuro, atingiu a alameda. Quase corria — e via o Jardim em torno de si, com sua impersonalidade soberba. Sacudiu os portões fechados, sacudia-os segurando a madeira áspera. O vigia apareceu espantado de não a ter visto.

Enquanto não chegou à porta do edifício, parecia à beira de um desastre. Correu com a rede até o elevador, sua alma batia-lhe no peito — o que sucedia? A piedade pelo cego era tão violenta como uma ânsia, mas o mundo lhe parecia seu, sujo, perecível, seu. Abriu a porta de casa. A sala era grande, quadrada, as maçanetas brilhavam limpas, os vidros da janela brilhavam, a lâmpada brilhava — que nova terra era essa? E por um instante a vida sadia que levara até agora pareceu-lhe um modo moralmente louco de viver. O menino que se aproximou correndo era um ser de pernas compridas e rosto igual ao seu, que corria e a abraçava. Apertou-o com força, com espanto. Protegia-se tremula. Porque a vida era periclitante. Ela amava o mundo, amava o que fora criado — amava com nojo. Do mesmo modo como sempre fora fascinada pelas ostras, com aquele vago sentimento de asco que a aproximação da verdade lhe provocava, avisando-a. Abraçou o filho, quase a ponto de machucá-lo. Como se soubesse de um mal — o cego ou o belo Jardim Botânico? — agarrava-se a ele, a quem queria acima de tudo. Fora atingida pelo demônio da fé. A vida é horrível, disse-lhe baixo, faminta. O que faria se seguisse o chamado do cego? Iria sozinha... Havia lugares pobres e ricos que precisavam dela. Ela precisava deles... Tenho medo, disse. Sentia as costelas delicadas da criança entre os braços, ouviu o seu choro assustado. Mamãe, chamou o menino. Afastou-o, olhou aquele rosto, seu coração crispou-se. Não deixe mamãe te esquecer, disse-lhe. A criança mal sentiu o abraço se afrouxar, escapou e correu até a porta do quarto, de onde olhou-a mais segura. Era o pior olhar que jamais recebera. Q sangue subiu-lhe ao rosto, esquentando-o.

Deixou-se cair numa cadeira com os dedos ainda presos na rede. De que tinha vergonha?

Não havia como fugir. Os dias que ela forjara haviam-se rompido na crosta e a água escapava. Estava diante da ostra. E não havia como não olhá-la. De que tinha vergonha? É que já não era mais piedade, não era só piedade: seu coração se enchera com a pior vontade de viver.

Já não sabia se estava do lado do cego ou das espessas plantas. O homem pouco a pouco se distanciara e em tortura ela parecia ter passado para o lados que lhe haviam ferido os olhos. O Jardim Botânico, tranqüilo e alto, lhe revelava. Com horror descobria que pertencia à parte forte do mundo — e que nome se deveria dar a sua misericórdia violenta? Seria obrigada a beijar um leproso, pois nunca seria apenas sua irmã. Um cego me levou ao pior de mim mesma, pensou espantada. Sentia-se banida porque nenhum pobre beberia água nas suas mãos ardentes. Ah! era mais fácil ser um santo que uma pessoa! Por Deus, pois não fora verdadeira a piedade que sondara no seu coração as águas mais profundas? Mas era uma piedade de leão.

Humilhada, sabia que o cego preferiria um amor mais pobre. E, estremecendo, também sabia por quê. A vida do Jardim Botânico chamava-a como um lobisomem é chamado pelo luar. Oh! mas ela amava o cego! pensou com os olhos molhados. No entanto não era com este sentimento que se iria a uma igreja. Estou com medo, disse sozinha na sala. Levantou-se e foi para a cozinha ajudar a empregada a preparar o jantar.

Mas a vida arrepiava-a, como um frio. Ouvia o sino da escola, longe e constante. O pequeno horror da poeira ligando em fios a parte inferior do fogão, onde descobriu a pequena aranha. Carregando a jarra para mudar a água - havia o horror da flor se entregando lânguida e asquerosa às suas mãos. O mesmo trabalho secreto se fazia ali na cozinha. Perto da lata de lixo, esmagou com o pé a formiga. O pequeno assassinato da formiga. O mínimo corpo tremia. As gotas d'água caíam na água parada do tanque. Os besouros de verão. O horror dos besouros inexpressivos. Ao redor havia uma vida silenciosa, lenta, insistente. Horror, horror. Andava de um lado para outro na cozinha, cortando os bifes, mexendo o creme. Em torno da cabeça, em ronda, em torno da luz, os mosquitos de uma noite cálida. Uma noite em que a piedade era tão crua como o amor ruim. Entre os dois seios escorria o suor. A fé a quebrantava, o calor do forno ardia nos seus olhos.

Depois o marido veio, vieram os irmãos e suas mulheres, vieram os filhos dos irmãos.

Jantaram com as janelas todas abertas, no nono andar. Um avião estremecia, ameaçando no calor do céu. Apesar de ter usado poucos ovos, o jantar estava bom. Também suas crianças ficaram acordadas, brincando no tapete com as outras. Era verão, seria inútil obrigá-las a dormir. Ana estava um pouco pálida e ria suavemente com os outros. Depois do jantar, enfim, a primeira brisa mais fresca entrou pelas janelas. Eles rodeavam a mesa, a família. Cansados do dia, felizes em não discordar, tão dispostos a não ver defeitos. Riam-se de tudo, com o coração bom e humano. As crianças cresciam admiravelmente em torno deles. E como a uma borboleta, Ana prendeu o instante entre os dedos antes que ele nunca mais fosse seu.

Depois, quando todos foram embora e as crianças já estavam deitadas, ela era uma mulher bruta que olhava pela janela. A cidade estava adormecida e quente. O que o cego desencadeara caberia nos seus dias? Quantos anos levaria até envelhecer de novo? Qualquer movimento seu e pisaria numa das crianças. Mas com uma maldade de amante, parecia aceitar que da flor saísse o mosquito, que as vitórias-régias boiassem no escuro do lago. O cego pendia entre os frutos do Jardim Botânico.

Se fora um estouro do fogão, o fogo já teria pegado em toda a casa! pensou correndo para a cozinha e deparando com o seu marido diante do café derramado.

— O que foi?! gritou vibrando toda.

Ele se assustou com o medo da mulher. E de repente riu entendendo:

— Não foi nada, disse, sou um desajeitado. Ele parecia cansado, com olheiras.

Mas diante do estranho rosto de Ana, espiou-a com maior atenção. Depois atraiu-a a si, em rápido afago.

— Não quero que lhe aconteça nada, nunca! disse ela.

— Deixe que pelo menos me aconteça o fogão dar um estouro, respondeu ele sorrindo.

Ela continuou sem força nos seus braços. Hoje de tarde alguma coisa tranqüila se rebentara, e na casa toda havia um tom humorístico, triste. É hora de dormir, disse ele, é tarde. Num gesto que não era seu, mas que pareceu natural, segurou a mão da mulher, levando-a consigo sem olhar para trás, afastando-a do perigo de viver.

Acabara-se a vertigem de bondade.

E, se atravessara o amor e o seu inferno, penteava-se agora diante do espelho, por um instante sem nenhum mundo no coração. Antes de se deitar, como se apagasse uma vela, soprou a pequena flama do dia.

Texto extraído no livro “Laços de Família”, Editora Rocco – Rio de Janeiro, 1998, pág. 19, incluído entre “Os cem melhores contos brasileiros do século”, Editora Objetiva – Rio de Janeiro, 2000, seleção de Ítalo Moriconi.

Julgue os itens: (UnB)
1- No conto “Amor”, de Laços de família (Clarice Lispector), a protagonista é uma mulher moderna, bastante envolvida com compromissos familiares e profissionais. O título do conto, “Amor”, tem a ver com o conflito emocional da personagem, que entra em crise por não poder dedicar-se mais ao marido e ao filho.
2- O mesmo conto, “Amor”, apresenta a história de uma mulher que, ao sair de casa, encontra um cego em um ponto de ônibus e o ajuda. Esse gesto fraterno, de amor franco e espontâneo, enche seu coração de paz e de felicidade. E ela volta para casa, depois de um passeio tranquilo, certa de que é simples e fácil amar o próximo.

Outros vestibulares:

3- De acordo com o texto, pode-se afirmar que a personagem Ana.
a) sintetiza as qualidades da mulher burguesa e rica, que se responsabiliza pelo lar e em momento algum questiona suas atribuições.
b) é símbolo da mãe e da esposa de classe baixa, que vê nas tarefas do lar a verdadeira forma de ser feliz, mas almeja ser independente.
c) representa a mulher de classe média que cuida de suas tarefas, mas não sente prazer nisso, pois é incomodada por sua família.
d) é produto de uma sociedade feminista, o que se pode confirmar pela autonomia que tem para realizar suas tarefas.
e) constitui a referência do lar de classe média, no qual tem como missão a tarefa de organizá-lo e de cuidar dos familiares.

4- Leia o seguinte trecho do conto "Amor", de Clarice Lispector.
“O mundo se tornara de novo um mal-estar. Vários anos ruíam, as gemas amarelas escorriam. Expulsa de seus próprios dias, parecia-lhe que as pessoas da rua eram periclitantes, que se mantinham por um mínimo equilíbrio à tona da escuridão – e por um momento a falta de sentido deixava-as tão livres que elas não sabiam para onde ir. Perceber uma ausência de lei foi tão súbito que Ana se agarrou ao banco da frente, como se pudesse cair do bonde, como se as coisas pudessem ser revertidas com a mesma calma com que não o eram”.
(LISPECTOR, Clarice. Laços de família. 11. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1979. p. 21-2.)

Com base nesta leitura, é correto afirmar:
a) No trecho "a falta de sentido deixava-as tão livres que elas não sabiam para onde ir", emerge a força do fantástico, traço tão significativo neste conto como em todos os demais contos de Laços de família.
b) No trecho "como se as coisas pudessem ser revertidas com a mesma calma com que não o eram", percebe-se uma referência à súbita paixão que invade a protagonista, provocando o desequilíbrio familiar e o desejo de viver ao lado do amante.
c) No trecho "Expulsa de seus próprios dias", revela-se o conflito da protagonista ao se defrontar, no espaço urbano, com uma cena comum que desencadeia uma reavaliação de sua vida íntima e doméstica.
d) No trecho "parecia-lhe que as pessoas da rua eram periclitantes", destaca-se a atmosfera de mistério que provoca a aproximação entre esse conto e as histórias policiais com sua ambientação urbana.
e) No trecho "Vários anos ruíam", sobressai uma marca destacada dos contos da autora: apresentar narrativas cuja ação se estende por uma longa duração de tempo.

terça-feira, 11 de julho de 2017

Análise: Rhythm 05 - Marina Abramovic


Rhythm 5 (Ritmo 5), 1974 - Nesse trabalho (foto acima), realizado no Centro do Estudante de Belgrado, a artista armou no chão uma estrutura de madeira no formato de uma grande estrela, deitou-se em seu espaço interior, vazio, e ateou fogo. O "método Marina Abramovic", ou seja, uma série de exercícios desenvolvidos pela artista para explorar os limites do corpo e da mente - e o público poderá experimentá-los.

Marina Abramovic
Em 30 de novembro de 1946, Marina Abramovic nasceu no comunismo Belgrado, Jugoslávia. Aos 18 anos, seu pai (Vojo, que fazia parte da guarda de elite do marechal), deixou a família, deixando a mãe de Marina Danica cuidar dela e de seu irmão Velimir. A mãe de Marina apoiou fortemente o controle comunista e tornou-se muito rigorosa após a partida do marido. Ela era difícil e violenta no entanto, porque ela era uma historiadora de arte, ela sempre apoiava os interesses de Marina na arte. Marina foi estudante na Academia de Belas Artes em Belgrado de 1965 a 1970. Ela completou seus estudos de pós-graduação na Academia de Belas Artes de Zagreb, SR Croácia, em 1972. De 1973 a 1975, ela ensinou na Academia de Belas Artes em Novi Sad. E mais tarde mudou-se para Amsterdã.

Marina Abramovic concentra-se em performances que geralmente afetam fisicamente seu corpo e muitas vezes incluem a participação do público. Isso é feito para mostrar um senso de vulnerabilidade. Seu trabalho centra-se principalmente nos temas de confiança, resistência, limpeza, exaustão e partida. Nascer em um país comunista afetou enormemente Abramovic enquanto ela estava crescendo, é por isso que muito do seu trabalho se concentra na idéia de limpeza, representando a idéia de que ela está sendo limpa de seu passado comunista uma vez que ela deixou a Iugoslávia. Por exemplo, em sua peça intitulada “Rhythm 5” que ocorreu em 1974, (parte da série Rhythm), Abramovic fez uma performance em que ela cortou o cabelo e as unhas e as unhas e os jogou e os jogou em uma estrela soviética flamejante. Depois, ela se atirou na estrela para representar uma purificação e limpeza de seu passado, no entanto, quando ela se jogou, ela perdeu a consciência e foi tirada da performance. Como resposta a sua perda de controle no desempenho anterior, Abramovic criou outra peça intitulada "Rhythm 2" (1974), onde ela tomou medicação que fez com que seus músculos se contraíram violentamente durante 50 minutos, ela tomou outra medicação que relaxou completamente seus músculos Fazendo com que eles não respondessem, o desempenho terminou 6 horas depois, uma vez que a medicação desapareceu.

Entre 1976 e 1988, Abramovic começou a trabalhar com o artista alemão Ulay. Juntos, seu trabalho focalizou principalmente a identidade ego e artística, bem como a confiança e os relacionamentos. Na performance: "Respirando / Respirando" (1977), os dois artistas conectados nas bocas inalaram os respiros exalados uns dos outros até que ambos se tornaram inconscientes de respirar dióxido de carbono. Isso foi feito para explorar as ideias de dependência e absorção metafórica da vida de outra pessoa.

Sua peça mais recente foi em 2010 chamada "O Artista está presente", onde ela se sentou em uma mesa no MoMA e os membros da audiência podiam se sentar de frente para ela. Isso foi feito para estabelecer uma conexão emocional entre o artista e o espectador sem usar o idioma. Marina Abramovic está atualmente com sede em Nova York e atualmente está trabalhando no Instituto de Artes Marciais de Marina Abramovic.

Resolução: Questão do PÁS 3ª ETAPA- Umberto Boccioni

Questão do PÁS 3ª ETAPA
Umberto Boccioni. Formas únicas de continuidade no espaço, bronze, 1913

1. Nessa escultura de Umberto Boccioni, o movimento expressivo apresentado reflete as qualidades de peso e leveza na forma geral da figura.

Resolução: Questão PÁS 3ªETAPA (2011)- Portinari

QUESTÕES DO PÁS 3ªETAPA
Portinari é a figura-símbolo da modernidade possível num país periférico, e isso parece ser uma grave falha para os partidários da modernidade a todo custo, guiados por critérios analíticos de derivação formalista. (Annateresa Fabris. Candido Portinari. In: Artistas brasileiros. São Paulo: EDUSP, n.o 4, 1996, p. 14.)

O café sempre foi um tema recorrente nas obras literárias e na pintura de Portinari. Ele está na lembrança das famílias de imigrantes italianos que chegaram ao Brasil no final do século XIX, para trabalhar na colheita do café no interior de São Paulo. Portinari, por exemplo, cita vários versos escritos pelo pai em que o chamado ouro verde é lembrado, como o seguinte: “Saí das águas do mar e num pé de café nasci”. (Internet: .)
Athos Bulcão. Painel externo do edifício do Instituto de Artes (pormenor), 1998, Campus Darcy Ribeiro, Universidade de Brasília.
Candido Portinari. Café, 1935, óleo sobre tela, 130 cm × 195 cm, Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro.
Candido Portinari. Paz, 1952-56, óleo sobre madeira, 1.400 cm × 953 cm, Organização das Nações Unidas, Nova Iorque.

Tendo como referência os textos e as figuras acima e os múltiplos aspectos a eles relacionados, julgue os itens:(3ªETAPA-2011)
1. Nas obras Café e Paz, Candido Portinari criou personagens individualizados, sem se preocupar com a tipificação de trabalhadores e da população oprimida, ou seja, com a constituição de uma imagem identitária de cunho ideológico-social.
2. Nos painéis de azulejos de Athos Bulcão, em Brasília, identifica-se um princípio analítico referente às combinações do aspecto formal de cada azulejo em um conjunto plástico.



Análise: Improvisação nº 23 Kandinsky


A obra é um figura abstrata, caráter contemplativo contrário ao narrativo da arte figurativa, com libertação da cor em relação a forma. A arte abstrata geralmente é isenta de objetividade, interesses e direcionamentos que não fossem essencialmente espirituais. Algo que transcende a materialidade, ou seja, o abstrato. Arte para melhorar o homem transformado pela guerra e pelo materialismo. A tela Improvisação 23 traduz isso, apresenta um equilíbrio homogêneo, porém dinâmico. As manchas coloridas servem de plano de fundo para as linhas e o movimento é obtido através das linhas diagonais e curvas presentes. Aqui predomina o ritmo conduzido pela música, já que Kandinsky pintava por ela. Wassily Kandinsky, um artista plástico russo, foi professor de uma das maiores escolas de artes e design do mundo, a Bauhaus. É introdutor da abstração no campo das artes visuais. Apesar da origem russa, adquiriu a nacionalidade alemã em 1928 e a francesa em 1939. Kandinsky faleceu na França, no ano de 1944 devido a uma arteriosclerose, aos 78 anos. Inovou as artes plásticas, influenciando muitas outras, e quebrou a ideia de tudo o que era conhecido até à altura com os seus ideais. A criação de Kandinsky de trabalhos puramente abstratos seguiu um longo período de desenvolvimento e amadurecimento do pensamento teórico, baseado nas suas experiências pessoais artísticas. A isso ele chamou de beleza interior, fervor de espírito e uma necessidade funda de desejo espiritual, que foi o aspecto principal da sua arte.

Tendo como referência a obra Improvisação número 23, de Wassily Kandinsky, apresentada acima, julgue os próximos itens.(PÁS 3ª ETAPA-2013)

1. Kandinsky reformula, refaz, inventa, segue a imaginação, ancorada na subjetividade e no individualismo, e cria um mundo de formas e cores desvinculado do mundo físico, real.
2. A influência da linguagem da música na pintura de Kandinsky está evidente não só no título da obra apresentada acima, mas também no movimento geral da composição, cujo ritmo está representado por pontos, linhas, manchas, traços negros e direcionais ascendentes, descendentes ou rotativos.
3. O Modernismo rompeu com a tradição da representação do mundo físico tal como é percebido e privilegiou as condições de representação e, assim, transformou a própria arte em objeto de criação.


domingo, 2 de julho de 2017

Análise: Êxodos - Sebastião Salgado

O fotógrafo mineiro Sebastião Salgado precisou deixar o Brasil na década de 1960. Militante da esquerda, viu-se perseguido pelo regime militar e foi obrigado a ir para a França. Já formado em economia no Brasil, teve que trabalhar descarregando caminhões numa cooperativa de estudantes. A esposa, Lélia, atuava como balconista. Sensível às dificuldades por que passam os imigrantes, afinal ele as havia sentido na pele, Sebastião documentou, durante seis anos, em 40 países, a vida de pessoas que, como ele, tiveram que abandonar sua pátria. As fotos Foram reunidas em um livro homônimo, que foi lançado pela Companhia das Letras em 2000. Também as fotografias se encontram em exposição. Sebastião observa que o movimento migratório, na maioria das vezes, é realizado contra a vontade do próprio migrante. “É uma história perturbadora, pois poucas pessoas abandonam a terra natal por vontade própria. Algumas sabem para onde estão indo, confiantes de que as espera uma vida melhor. Outras estão simplesmente em fuga, aliviadas por estarem vivas. Muitas não conseguirão chegar a lugar nenhum”. Os motivos pelos quais elas abandonam sua nação são diversos, mas a guerra é um dos mais frequentes.
Há, por exemplo, mulheres que saíram de Kosovo e partiram em direção à Albânia. Essas imagens estão na seção Refugiados e Migrados. As Crianças também protagonizam alguns dos registros mais emocionantes, em uma parte da mostra dedicada a elas. “Em toda situação de crise, as crianças são as maiores vítimas. São sempre as primeiras a sucumbir à fome ou à doença. Emocionalmente vulneráveis, não têm condições de compreender por que são expulsas de suas casas”, anota. Os pequenos migrantes estão na seção Retratos de Crianças.
Crianças em um Orfanato em Zaire, África em 1994. Além das duas seções citadas, há ainda outras três. A primeira, chamada África, é dedicada a países como Moçambique, Angola e Sudão. Uma outra parte, Luta Pela Terra, retrata pessoas que se recusaram a desistir e permaneceram em seu lugar de origem, como índios da região amazônica. Finalmente, há a seção Megacidades, que mostra grandes centros urbanos como Xangai e Jacarta, que recebem muitos imigrantes.
Refugiadas se preparam para voltar a Moçambique - Campo de trânsito de Mabamba Bay, Tanzânia, 1994.
Criança angolana deslocada para Cazombo, província do Alto Zambeze - Angola, 1997.

Meus ensaios e produções textuais

2023 MONOGRAFIA para conclusão da graduação Tecnologia em Gestão Pública no IFB  A FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA A DIVERSIDADE, um estudo sob...